Acórdão: Apelação Cível n. 2007.016743-5, de Brusque.
Relator: Des. Joel Figueira Junior.
Data da decisão: 11.10.2007.
Publicação: DJSC Eletrônico n. 337, edição de 23.11.2007, p. 140.
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INTERDIÇÃO C/C NOMEAÇÃO DE CURADORA INTERPOSTA PELA AVÓ MATERNA. MENOR DE QUINZE ANOS DE IDADE QUE SOFRE DE SÍNDROME DE ASPERGER. PEDIDO JURIDICAMENTE IMPOSSÍVEL. EXTINÇÃO DO PROCESSO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. EXEGESE DO ART. 267, INCISO VI DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
A interdição é ato pelo qual o togado retira do maior de idade a capacidade de gerir seus atos da vida civil, nomeando-lhe um curador que o represente e administre seus bens.
Se o interditando é menor de idade absolutamente incapaz, juridicamente impossível se afigura o pedido de interdição, na exata medida em que ele jamais exerceu a capacidade civil, não encontrando a pretensão formulada respaldo no art. 1.767 do Código Civil.
Nada obsta que após o atingimento dos 16 anos, seja o pedido refeito, sem prejuízo da possibilidade de os interessados postularem a guarda.
Vistos, relatados e discutidos estes autos da Apelação Cível n. 2007.016743-5, da comarca de Brusque/1ª Vara, em que é apelante M. V. S.:
ACORDAM, em Primeira Câmara de Direito Civil, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento. Sem custas.
RELATÓRIO
M. V. S. ajuizou ação de interdição c/c nomeação de curadoria de K. S. da C. pelos fatos e fundamentos jurídicos descritos na exordial de fls.02/05, alegando, em síntese, que:
O infante K. S. da C. é filho de J. C. O. e M. S. da C., nascido em 26 de maio de 1992, em que pese desde seus dois anos de idade residir com seus avós maternos.
Os genitores do interditando não possuem condições financeiras para sustenta-lo, pois o infante sofre da Síndrome de Asperger necessitando de maiores cuidados.
Em razão da situação especial de seu neto pretende requerer o benefício assistencial para o INSS, fazendo-se necessária a interdição e curatela.
Ao final, requer a procedência do pedido para que seja interditado K. S. da C. nomeando-se como sua curadora a Requerente.
À causa foi atribuído o valor de R$ 370,00 (trezentos e setenta reais) e a inicial veio instruída com os documentos de fls. 06/15.
O Ministério Público opinou pela extinção da demanda sem resolução do mérito, com fulcro no art. 267, inciso VI do CPC por tratar-se de pedido juridicamente impossível (fls. 17/18).
Sentenciando (fls. 19), o Magistrado a quo declarou extinto o processo sem resolução do mérito (art. 267, inciso VI do CPC), bem como deferiu os benefícios elencados na Lei n. 1.060/50.
Inconformada, a Demandante interpôs o presente recurso (fls. 26/32) objetivando, em síntese a reforma da sentença repisando os argumentos expostos na peça vestibular.
A douta Procuradoria-Geral de Justiça em parecer da lavra do Procurador, Paulo Roberto de Carvalho Roberge, opinou por conhecer e negar provimento do recurso.
Presentes os requisitos de admissibilidade do recurso.
VOTO
O recurso interposto pela Autora deve ser conhecido e desprovido, pelas razões bem lançadas no parecer do douto Procurador de Justiça Paulo Roberto de Carvalho Roberge, o qual acolho como razão de decidir, transcrevendo-o, in verbis:
"(...) Pode-se definir a curatela como o 'encargo cometido a alguém, para dirigir a pessoa e administrar os bens de maiores incapazes (Caio Mário da Silva Pereira, in Instituições de Direito Civil. 3 ed. Rio de Janeiro, Forense, 1979, v. V, p. 308), o que permite concluir que a ação de interdição é a ação que declara a perda da capacidade civil de alguém para reger a sua própria pessoa e de administrar os seus bens.
Parece evidente, então, que quando se fala em perda da capacidade civil se está falando em relação a quem a tem, pois só este é que pode perder a capacidade civil. Via de conseqüência, em hipóteses como a dos autos, em que o interditando é menor, absolutamente incapaz, o pedido efetivamente se mostra juridicamente impossível.
Vale o registro de que todos os precedentes citados pelo apelante dizem respeito aos menores relativamente incapazes. A diferença para a situação retratada nos autos é que os absolutamente incapazes se fazem representados pelo responsável e não meramente assistidos.
No que interesse ao feito, como o Direito disciplina a curatela como encargo cometido a alguém para dirigir a pessoa e administrar os bens de maiores incapazes, o pedido se revela mesmo juridicamente impossível, não merecendo reparos, pois, a respeitável sentença.
Pelos exposto entende, esta Procuradoria de Justiça, deve ser negado provimento ao recurso interposto, mantendo-se a sentença por seus próprios fundamentos." (fls. 42/43).
Em arremate João Paulo Lucena assim se posiciona sobre a matéria aqui discutida:
"(...) Remontando ao direito romano pré-clássico, poderia uma pessoa ter a capacidade de direito e, no entanto, em razão da idade, do sexo, ou da mente, não ter a capacidade de fato, sendo, portanto, incapaz para postular pessoalmente os seus direitos. A fim de assegurar a proteção e a representação em juízo dos incapazes, desenvolveram os romanos os institutos da tutela e da curatela.
[...]
Referindo-se ao nosso direito civil, CAIO MÁRIO afirma que, contemporaneamente, o sistema legal de proteção aos incapazes desenvolve-se por três vias, tendo em vista a condição deles:
a) o pátrio poder;
b) a tutela;
c) a curatela;
'São, pois, três sistemas de proteção que não se confundem. O direito moderno, diversamente do que ocorria antes, diferencia os três institutos na sua estrutura, no seu mecanismo e nos seus efeitos. Outros sistemas jurídicos, posto distingam a tutela da curatela, referem-se todavia à tutela de maiores. No direito brasileiro, a tutela refere-se sempre aos menores.
'Completando a trilogia assistencial dos incapazes, o direito disciplina a curatela, como encargo cometido a alguém, para dirigir a pessoa e administrar os bens de maiores incapazes. A definição, todavia, não abrange todas as espécies de curatela, algumas das quais, pela natureza e efeitos específicos, mais tecnicamente se denominam de curadorias.
Quando falamos de interdição para efeitos do art. 1.177, palavra derivada de interdictio, de interdicere (proibir, interdizer, vedar), referimo-nos à privação de alguém para a prática de certos atos da vida civil, fundada na lei ou em ordem judicial, mesmo que digam respeito a seus bens ou a sua pessoa. Essa interdição especializa-se em judical, legal, ou penal, impondo à pessoa o estado de incapaz, às vezes relativo, às vezes absoluto." (Comentários ao Código de Processo Civil, vol. 15. Ed. RT. São Paulo. 2000, pg. 290/291).
Em complemento, assinala-se que nada obsta que após o atingimento dos 16 anos, seja o pedido refeito, sem prejuízo da possibilidade de os interessados postularem a guarda.
DECISÃO
Nos termos do voto do Relator, decidiu a Primeira Câmara de Direito Civil, por unanimidade conhecer do recurso e negar-lhe provimento.
O julgamento, realizado em 02 de outubro, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Carlos Prudêncio, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Des. Henry Petry Júnior.
Pela Procuradoria-Geral de Justiça lavrou parecer o Exmo. Sr. Procurador de Justiça Paulo Roberto de Carvalho Roberge.
Florianópolis, 11 de outubro de 2007.
Joel Dias Figueira Júnior
RELATOR
STJ - Superior Tribunal de Justiça BRASIL, o autor
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